Industrialização local, falta de oportunidades de emprego e danos socioambientais

Fragmento de entrevista realizada com pescador(a) artesanal em 2016

Entrevistador(a): Você acha, por exemplo, que a prefeitura, o governo, se escoram muito, por exemplo, na presença do TAMAR aqui, ICMBio, você acha que algumas vezes essas organizações cumprem o papel de prefeitura?

​Entrevistado(a): Não, não. (…) Quando o projeto TAMAR tinha base aqui, quando teve a Eco Cidadania, eles investem raramente na educação ambiental, entendeu? Consciência ambiental… Povoação não existe! até Leão, não tem a Leão que é da Coca Cola? Eles fazem mais, que é limpeza de praia. (…) Uma vez por ano tem limpeza de praia, que é 27 de setembro. 27 de setembro é dia mundial de limpeza dos rios e das praias, vocês sabiam?

Entrevistador(a): Não… aí a Leão sempre faz limpeza aqui?

Entrevistado(a): já fez umas duas vezes aqui. Traz crianças, até traz dois ônibus de Linhares, aí junta com os moleques daqui. Cata na praia aí toda, faz limpeza e, faz lanchinho, distribui camisas, tira fotos, faz o seu registro, [para ter] as evidências e mete o pé!

Entrevistador(a): e a Petrobrás?

Entrevistado(a): Petrobrás é outra também que é complicada. Igual, área de emprego, que eles têm uma condicionante também lá que tem que colocar [pessoas de Povoação e Regência] e tal… Com muita luta conseguiram contratar… tava em terceiro plano os funcionários daqui, porque tem pessoas aqui qualificadas pra trabalhar ali: eletricista, soldador, pintor, de manutenção – tem vários! – que pode tá trabalhando lá. Só que eles não aproveitam, né? Agora que estão aproveitando mesmo que tem pessoas aqui que estão trabalhando na UTGC [Unidade de Tratamento de Gás de Cacimbas, da Petrobrás], [por]que antes reclamaram por causa disso aí. Falar nisso, vai ter uma reunião com o pessoal da Petrobrás (…) pra ver se aproveitam mais o pessoal daqui. (…) Porque parece que uma empresa lá que perdeu o contrato de manutenção. A outra que ganhou estão trazendo gente de fora também. Porque sempre que ganha tem um encarregado que tem uma equipe de fora.

 

Em Regência, eu trabalhei na base lá são todos de Regência. A maioria são de Regência. Tudo os caboclos de Regência. Que quando sai empresa e entra outra a equipe continua, [por]que os caras já estão ali trabalhando, pra que trocar?! E agora eles estão fazendo isso [substituição de contratados] aqui [em Povoação]! Recebi uma denúncia séria, que tá acontecendo isso aqui. Quando vier pra reuniões, eu vou lá pra falar: “vem cá, tá acontecendo isso, isso e isso. Vocês estão sabendo? Não? Então fique sabendo!” (…). Mudou empresa, mudou contrato, só que eles estão trazendo gente de fora! Trouxeram pessoas de fora pra ocupar a vaga que era daqui! E é certo isso?!

 

​Entrevistador(a): E o que mais Petrobrás trouxe?

Entrevistado(a): Trouxe os peões da obra de fora que vieram trabalhar pra cá e ficaram. 

Entrevistador(a): O pessoal ficava aqui? Moravam aqui os trabalhadores?

Entrevistado(a): Na primeira fase mesmo que foi a bagunça. Quando instalou a UTGC aqui, a primeira fase foi (…) uns dez anos atrás. Na fase daqueles ônibus. Não tinham acampamentos. Ou seja, o pessoal que vinha de fora trabalhar – que foram muitas pessoas da Bahia, de Sergipe, de qualquer lugar – eles vieram alojar em Povoação. Povoação não estava preparada para isso. Não teve estudo real de impacto. Teve muito impacto! Sabe por quê? De ônibus, tinha uma faixa de uns quinze ônibus aqui em Povoação. Ficavam ali em frente de casa. Ficavam bastante ônibus ali. Quando chovia, ficava lama… (….). Aí passou a fase 2 e a fase 3. Aí, foi assim, entre aspas, mais planejado, [pois] fizeram o alojamento lá perto ali da UTGC, em Cacimbas  (…) aí o pessoal [de fora] ficava lá, confinado lá. Mas, final de semana, de vez em quando eles viam pra cá ainda. Ou beber, ou gastar dinheiro, ou caçar confusão também, entre aspas. Tem tudo junto, né? Ainda foi ruim, entendeu? O impacto negativo foi esse. Quando vem uma coisa assim, tem várias coisas que acontecem, positivo e negativo… E o positivo que seria o emprego que todo mundo pensa, foram poucos empregos, entendeu? E agora que o pessoal tá lutando…

Entrevistador(a): E agora tá compensando?

Entrevistado(a): Isso aí… Uma vez eu fui numa reunião aqui em Povoação, que eles iam reflorestar uma área lá em Lagoa do Meio [bairro do município de Linhares]. Eles iam plantar árvores lá (…), porque eles tiraram uma faixa de restinga aqui [em Povoação]. Aí eu falei: “ué, que negócio é esse?! Como é que vocês rancam  o negócio aqui e vai investir lá?! Por quê?! Que história é essa?!” (…). Aí os caras vieram explicar: “não, porque a gente vai reflorestar Lagoa do Meio, tal, tal…”. Aí, eu parei, “opa! Você está falando sério?! Isso aí mesmo?!” Aí, rapaz, botei fogo! Falei: “ué, como é que vocês rancam um pedaço de restinga aqui e vai reflorestar, vai investir lá?! (…) Uma coisa vai compensar a outra?! Mas esse compensamento seu aí, acho que não tá certo!” Vocês concordam? Pô, não tô falando pra botar nada aqui, mas o certo seria investir aqui! Ou seja, a comunidade impactada diretamente que é o entorno aqui, investimento, nada! No Degredo [comunidade do distrito de Povoação] não tem nada no Degredo